Estudo é o primeiro a empregar nova tecnologia vestível de tomografia para geração imagens neurológicas de recém-nascidos no berço

Por que os bebês dedicam tanto tempo ao sono? Uma pesquisa publicada em janeiro de 2023 na revista especializada ScienceDirect, explora o intrigante mundo da conectividade cerebral durante o sono neonatal. Liderada pela pesquisadora Júlia Uchitel, a equipe composta por Borja Blanco, Liam Collins-Jones e outros cientistas empregou uma nova geração de tecnologias vestíveis de tomografia óptica difusa de alta densidade (HD-DOT).

A pesquisa surgiu da necessidade de superar as limitações das ferramentas tradicionais, como a ressonância magnética funcional (fMRI), ao estudar recém-nascidos. O objetivo era entender a conectividade funcional em repouso (RSFC), essencial para desvendar os mistérios da arquitetura cerebral em desenvolvimento.

A conectividade funcional em repouso em recém-nascidos tem proporcionado uma compreensão mais profunda da arquitetura funcional intrínseca do cérebro em desenvolvimento. Enquanto a fMRI oferece vantagens, sua aplicação em ambientes clínicos é limitada para recém-nascidos. Estudos com a fMRI exigem períodos prolongados fora das unidades clínicas, imobilidade durante a gravação e, muitas vezes, sedação dos bebês, impactando a hiperemia funcional. Essas condições limitam significativamente o número e os tipos de estudos que podem ser realizados em recém-nascidos, particularmente para aqueles vulneráveis.

Diante disso, o objetivo da equipe foi adaptar o HD-DOT vestível para uso em recém-nascidos em ambientes clínicos, superando desafios enfrentados por métodos tradicionais. O estudo, realizado no Rosie Hospital (Cambridge University Hospitals NHS Foundation Trust), envolveu 45 neonatos saudáveis de termo, ou seja, recém nascidos com condições clínicas normais ou de baixo risco (com boa vitalidade, crescimento intra-uterino adequado e ausência de patologias ou malformações). O estudo teve aprovação de comitê de ética e o consentimento informado por escrito dos pais foi fundamental para a participação.

Dos 45 neonatos, 17 conjuntos de dados foram excluídos devido a segmentos insuficientes para análise subsequente de FC, resultando em 28 indivíduos para análise dos dados HD-DOT. A correlação significativa foi observada no córtex motor contralateral à região da semente, sendo mais evidente para a semente esquerda e HbO em comparação com HbR. A correlação diminuiu radialmente em direção ao córtex parietal, sugerindo a presença de redes fronto-parietais. Essas descobertas indicam padrões fisiologicamente significativos na conectividade funcional (FC) durante o sono neonatal.

Em uma conclusão inovadora, o estudo destaca-se como o primeiro a empregar HD-DOT vestível em recém-nascidos para neuroimagem no berço. A adaptação dessa tecnologia para a população neonatal, com o desenvolvimento de um arnês apropriado, permitiu longos períodos de gravação, demonstrando a viabilidade de estudos em ambientes clínicos. Além disso, o sistema foi bem tolerado pelos bebês, com duração máxima do estudo ultrapassando duas horas.

“Estas considerações são importantes para recém-nascidos vulneráveis, tais como bebés prematuros em cuidados intensivos, para os quais fibras ópticas volumosas ou transporte para fora da unidade de cuidados intensivos não são viáveis”, relatam os autores do estudo.

O sistema

Utilizando a abordagem de alimentação e envoltório para promover o sono, as sessões de registro de dados tinham o objetivo de durar uma hora, mas algumas foram encerradas antes, devido a procedimentos clínicos ou despertares. Um sistema vestível, chamado LUMO, foi empregado, consistindo em módulos hexagonais com fontes de LED e detectores. Esses módulos foram integrados em uma touca flexível para neonatos, chamada EasyCap, garantindo melhor adaptação às diferentes formas de cabeça. A touca foi posicionada usando medições do perímetro cefálico, e a localização exata dos sensores foi obtida através de varreduras tridimensionais usando um iPhone.

O instrumento utilizado pelos pesquisadores para fazer neuroimagem funcional do cérebro de recém-nascidos foi o capacete vestível chamado HD-DOT. O design modular e portátil permitiu aplicar o sistema ao lado do berço, com fácil transporte. Os resultados mostraram a viabilidade e tolerância do método, revelando conexões cerebrais durante o sono. Além disso, introduzem um esquema de parcelamento cortical para análises mais eficientes.

Análise

Para analisar dados HD-DOT, canais com coeficiente de variação baixo foram descartados, e artefatos de movimento foram removidos. Optou-se por usar 3 minutos de dados livres de artefatos, classificando-os como AS ou QS com base em vídeos. A série temporal média foi processada para remover ruídos fisiológicos, resultando em dados de 11 sujeitos classificados como AS e 23 como QS. O estudo aplicou métodos para garantir a confiabilidade na análise da conectividade funcional em bebês.

As descobertas representam um avanço significativo na compreensão da atividade cerebral funcional durante o sono neonatal. A aplicação do HD-DOT vestível abre perspectivas para estudos mais amplos, oferecendo insights valiosos para bebês vulneráveis, como os prematuros em cuidados intensivos, onde outras abordagens não são viáveis. Este marco na neuroimagem neonatal promete contribuir para futuras aplicações clínicas e avanços na compreensão do desenvolvimento cerebral dos recém-nascidos.

Viabilidade x pesquisadores

A pesquisa foi financiada por bolsas da Action Medical Research e NIHR Cambridge Biomedical Research Centre. A equipe de pesquisadores inclui Júlia Uchitel, Borja Blanco, Liam Collins-Jones, Andrea Edwards, Emma Porter, Kelle Pammenter, Jem Hebden, Robert J Cooper e Topun Austin. Austin recebeu apoio da NIHR Cambridge BRC e NIHR Brain Injury MedTech Co-operative e Júlia Uchitel é beneficiária de bolsas Marshall e Cambridge Trust.

O artigo pode ser acessado aqui.