O aumento do tempo médio de vida em diversos países torna ainda mais importante conhecer melhor a demência, um termo amplo associado a um grupo de condições que afetam negativamente a memória, a cognição e a tomada de decisão diária na vida dos pacientes, causando-lhes grave incapacidade e redução na qualidade de vida. Relacionado à idade, o problema afeta hoje em dia mais de 55 milhões de pessoas em todo o mundo, e espera-se que esse número triplique até 2050.
Apesar dos esforços de pesquisa, ainda não existem tratamentos eficazes que possam interromper ou reverter a progressão da demência. Por isso, é crucial preveni-la controlando os fatores de risco passíveis de alteração.

Estudos sobre o papel da vitamina D na doença de Alzheimer (uma das formas de demência mais conhecidas) sugerem seu envolvimento na modulação das placas da proteína beta-amiloide, fator-chave na patologia desse distúrbio. Além disso, há evidências de que a vitamina D pode oferecer neuroproteção contra a hiperfosforilação de outra proteína, a tau, induzida pela beta-amiloide.
A deficiência e a insuficiência de vitamina D, geralmente definidas por níveis séricos de 25-hidroxivitamina D – ou 25(OH)D – inferiores a <30 nmol/L e <50 nmol/L, respectivamente, têm altas taxas de prevalência. Estudos sugerem que níveis de 25(OH)D menores que 50 nmol/L podem ser um fator de risco para demência, especialmente para a doença de Alzheimer.

Os resultados de ensaios clínicos passados sobre suplementação de vitamina D variam consideravelmente, o que pode ser atribuído a diferenças de dosagem, tamanhos de amostra pequenos e períodos de acompanhamento insuficientes. Um novo estudo publicado em janeiro na revista The American Journal of Clinical Nutrition, realizado por cientistas que atuam na Alemanha, trouxe atualizações para uma ampla gama de fatores que podem causar confusão e busca identificar grupos capazes de se beneficiar mais da suplementação de vitamina D.

Taxas significativas de sobrepeso e obesidade

No presente estudo, os dados foram obtidos de uma coorte prospectiva, o UK Biobank do Reino Unido – um estudo longitudinal que recrutou mais de meio milhão de pessoas, com idades entre 40 e 69 anos, com alguns poucos fora dessa faixa etária, entre 37 e 40 anos ou entre 70 e 73 anos. Pelos critérios definidos na pesquisa, os cientistas se concentraram em cerca de 270 mil participantes.

Os casos de demência de todas as causas, doença de Alzheimer e demência vascular foram obtidos por meio de dados interligados de registros de internações hospitalares e registros de óbitos dentro do UK Biobank. O período de acompanhamento variou entre 12,7 e 16,2 anos, contados a partir de março de 2006 até novembro de 2022.

Uma análise dos desfechos de demência avaliou 269.229 participantes, com média de idade de 62,1 anos no início do estudo. A maioria dos participantes era do sexo feminino (52,3%), com proporções significativas de sobrepeso (44,1%) e obesidade (25,2%). Havia baixos níveis de atividade física entre quase um quinto dos participantes, e as prevalências de hipertensão, diabetes e doença arterial coronariana eram de 35,5%, 6,3% e 8,3%, respectivamente.

Quanto ao status de vitamina D, a maioria dos participantes apresentava deficiência (18,3%) ou insuficiência (34,0%); apenas 5,0% relataram consumo regular de vitamina D e 19,8%, de suplementos multivitamínicos.

Entre todos os participantes, 2,6% desenvolveram demência durante o acompanhamento, com associações significativas entre deficiência e insuficiência de vitamina D e todos os tipos de demência. O risco de demência foi mais acentuado em indivíduos com níveis de 25(OH)D abaixo de 30 nmol/L. Análises de subgrupos como sexo e índice de massa corporal não mostraram diferenças substanciais nas associações entre status de vitamina D e desfechos de demência, exceto em relação à cor da pele – nesse último caso, aparentemente tampouco a deficiência ou a insuficiência de vitamina D estavam associadas aos resultados de demência nos participantes do estudo com tons de pele mais escuros.

Melhora significativa nos casos de Alzheimer

O uso de suplementos de vitamina D mostrou associação inversa significativa com a doença de Alzheimer após ajustes abrangentes, mas não em relação à demência vascular ou a todos os tipos de demência. O uso de multivitamínicos também foi associado a uma redução do risco de demência vascular, especialmente em pessoas com obesidade.

Os mecanismos potenciais envolvidos nesse processo incluem a influência da vitamina D na remoção de placas de beta-amiloide, a mitigação da citotoxicidade da amiloide e a redução da inflamação. A obesidade pode modular esses efeitos, tornando as pessoas com obesidade mais propensas a se beneficiar da suplementação de vitamina D.

Os resultados obtidos na pesquisa sugerem um papel potencial da vitamina D na prevenção da demência. No entanto, lembram os autores, são necessários ensaios clínicos randomizados de longo prazo para confirmar essas associações. Estudos futuros devem explorar os mecanismos subjacentes e incluir uma variedade de grupos populacionais para determinar os benefícios da suplementação de vitamina D na prevenção da demência.

O estudo “The associations of serum vitamin D status and vitamin D supplements use with all-cause dementia, Alzheimer’s disease, and vascular dementia: a UK Biobank based prospective cohort study” pode ser acessado na íntegra aqui.