Realizada por equipe da USP a partir de monitoramento não invasivo, a pesquisa também relacionou o envelhecimento com aumento no risco de comprometimentos na complacência
Um estudo piloto realizado no Hospital das Clínicas da Universidade de São Paulo (USP) em pacientes com Covid-19 identificou uma prevalência de comprometimento da complacência intracraniana em pacientes obesos quando comparados a pacientes não obesos. A pesquisa observou 50 pacientes internados de forma consecutiva em seis UTIs do Hospital entre maio e junho de 2020. Dentre eles, 23
apresentavam diversos graus de obesidade, um dos principais fatores de risco para agravamento em casos de Covid-19.
Conforme apontado pelo estudo, a correlação entre obesidade e hipertensão intracraniana já era conhecida no campo, exemplificada pela hipertensão intracraniana idiopática, também conhecida como pseudotumor cerebral, da qual entre 90% e 95% dos portadores são obesos. As causas têm sido atribuídas a diversos fatores ligados à obesidade, como perturbações na circulação de fluido cerebroespinhal, compressão de órgãos no tórax e abdômen e mesmo apneia do sono.
“A oxigenação pobre do sangue durante o sono, por causa da hipoventilação, provoca também um transtorno circulatório que pode fazer com que o volume sanguíneo cerebral seja maior do que o habitual: esse também é um mecanismo indireto que se pensa estar relacionado ao aumento da pressão intracraniana na obesidade”, afirma Sérgio Brasil, pesquisador pós-doutoral da divisão de neurocirurgia do HC/USP que liderou a pesquisa.
Acompanhamento e monitorização com métodos invasivos e não invasivos
Os casos foram acompanhados a partir de Doppler transcraniano para analisar a hemodinâmica encefálica, a dinâmica do fluxo sanguíneo no cérebro, e por um sensor não invasivo para monitoramento da forma do pulso da pressão intracraniana (PIC), o que permite caracterizar a complacência intracraniana, a capacidade do crânio em regular sua pressão interna. Foram realizadas duas medições de ambos os fatores: a primeira durante os três primeiros dias a partir da intubação e a segunda também em um período de 72 horas após a retirada da ventilação mecânica ou realização de
traqueostomia.
A pesquisa identificou que 78% (18) dos pacientes obesos apresentavam complacência intracraniana comprometida, contra 48% (13) dos pacientes não obesos. Além disso, 69% das pessoas obesas faleceram ou não puderam passar da ventilação mecânica para a ventilação espontânea, contra 44% dos casos de pessoas não obesas. Diversas alterações da circulação cerebral foram observadas, sendo
estas junto às alterações da complacência intracraniana associadas a quadros mais graves de Covid-19.
O estudo identificou, ainda, que pacientes mais idosos também apresentavam maior risco de comprometimento da complacência intracraniana. Conforme aponta Sérgio Brasil: “Os pacientes mais idosos com obesidade apresentaram maior chance de transtornos de complacência, o que também fortalece nossa suspeita de que em idade avançada existe também uma dificuldade maior no trânsito de líquor, o fluido cerebroespinhal”.
O artigo “Obesity and its implications on cerebral circulation and intracranial compliance
in severe COVID‐19″, que apresenta os resultados da investigação, foi publicado em 20
de maio de 2021 no periódico Obesity Science and Practice e pode ser acessado pelo
DOI: 10.1002/osp4.534.