(Imagem: DC Studio/Freepik)
Validado para monitoramento não invasivo da morfologia do pulso da pressão intracraniana, dispositivo brain4care permitiu análise minuciosa e precisa da relação entre indicadores de saúde cerebral e cardiológica
Uma pesquisa publicada no periódico Frontiers in Cardiovascular Medicine revela uma nova perspectiva sobre o impacto da hipertensão arterial essencial na saúde cerebral. Os pesquisadores mostraram que pacientes com hipertensão arterial apresentam risco de hipertensão intracraniana por elevação de marcadores como P2/P1 e Time to Peak (TTP), mesmo aqueles que tomam medicamentos para controle da pressão arterial. Esses resultados abrem caminho para novas áreas de pesquisa e tratamento.
O estudo “Intracranial pressure waveform in patients with essential hypertension” foi realizado ao longo de sete meses, com adultos diagnosticados com hipertensão arterial essencial (longa duração) atendidos no Centro de Pesquisa em Doenças Cardiometabólicas da Unidade de Hipertensão da Universidade Federal de Goiás (UFG), no período de novembro de 2022 a maio de 2023, utilizando a tecnologia brain4care para monitorar as variações de pressão e complacência intracraniana de forma não invasiva.
A princípio, os resultados descritos no artigo Intracranial Pressure During the Development of Renovascular Hypertension, publicado no periódico científico Hypertension em março de 2021, chamaram a atenção dos pesquisadores ao demonstrar que ratos com hipertensão arterial apresentaram aumento da pressão intracraniana (PIC) com alteração da morfologia do pulso. “A descoberta quebrou os paradigmas até então conhecidos pela comunidade científica”, comentou um dos autores da pesquisa, o médico cardiologista Dr. Weimar Sebba Barroso, durante a participação na 8ª Edição do Painel Científico da brain4care.
Até então o entendimento era de que existia uma autorregulação cerebral e que o aumento da pressão arterial não levaria ao aumento da pressão intracraniana, ou [que] isso poderia acontecer de forma tardia.
Dr. Weimar Sebba Barroso
A partir da descoberta, um trabalho em conjunto com profissionais de várias especialidades médicas passou a avaliar os diversos cenários da hipertensão arterial e os possíveis danos cerebrais vasculares em consequência. De acordo com os médicos que participaram do estudo, as avaliações sugerem que a autorregulação cerebral e a barreira hematoencefálica podem não ser tão eficazes quanto se acreditava anteriormente, levando a possíveis danos no sistema nervoso central em estágios mais precoces do que se imaginava.
“As pesquisas apontaram dados que realmente fugiram muito do padrão”, explicou a também autora e médica neurologista Dra. Polyana Vulcano de Toledo Piza, em sua participação na mesma edição do Painel Científico.
Percebemos que a barreira hematoencefálica não estava acontecendo e com isso, pacientes controlados, hipertensos de longa data, estavam sofrendo de alguma coisa que era invisível para nós. Essa descoberta apontou que estávamos errando em algum ponto.
Dra. Polyana Vulcano de Toledo Piza
A medições
O estudo teve como objetivo principal avaliar o comportamento da morfologia do pulso da PIC de maneira não invasiva em pacientes com hipertensão arterial essencial. Os participantes passaram por anamnese e exame físico de rotina. Os médicos também descreveram histórico de doenças clínicas, tempo e uso de medicamentos anti-hipertensivos.
A pressão arterial foi aferida de acordo com a metodologia preconizada pelas Diretrizes Brasileiras de Hipertensão, em que foi utilizado o aparelho oscilométrico automático (Omron HBP-1100). Após 5 minutos de repouso, foram realizadas 3 medidas consecutivas e registradas a média duas últimas medidas.
Já a avaliação da PIC não invasiva foi realizada por meio da tecnologia brain4care em um ambiente confortável e silencioso, com o paciente deitado e monitorado por 7 minutos. O primeiro e o último minuto foram descartados. Para o estudo, foi considerado hipertensão intracraniana, utilizando a tecnologia brain4care, o ponto de corte da relação P2/P1 ≥1,2 e o ponto de corte para Time to Peak (TTP) ≥0,25 segundos. Os valores de P2/P1 de 1,0–1,19 e os valores de TTP de 0,20 a 0,24 segundos foram considerados como uma zona cinzenta de complacência intracraniana anormal, mas não de hipertensão intracraniana.
Os resultados
Ao capturar deslocamentos nanométricos do osso do crânio e processar esses dados por meio de um software capaz de analisar e interpretar essas micro- oscilações, a tecnologia brain4care é capaz de gerar um relatório que revela a forma de onda do pulso intracraniano com dois picos distintos: P1 e P2. Esses picos indicam a pulsação arterial (P1), e a reverberação do fluxo sanguíneo cerebral arterial, refletindo a complacência intracraniana (P2), fornecendo uma análise minuciosa e precisa da PIC.
Foram incluídos no estudo 391 participantes. O valor de PIC normal foi encontrado em 21,7% dos pacientes, 32,7% apresentaram algum distúrbio relacionado às variações da complacência intracraniana e foi observado que 45,6% dos pacientes apresentaram hipertensão intracraniana. Além disso, mulheres apresentaram maior prevalência (50,3%) de hipertensão intracraniana. Os resultados sugerem que manter níveis ideais de pressão arterial sistólica e diastólica pode reduzir o estresse nos vasos sanguíneos, minimizando o risco de ruptura da barreira hematoencefálica.
O estudo não apenas corrobora a hipótese de existência de uma relação entre hipertensão arterial e distúrbios cerebrovasculares, mas também desafia a tese da eficácia da autorregulação cerebral em pacientes hipertensos. “Nossas descobertas também levantam uma questão sobre o conceito aceito sobre a capacidade e eficácia da autorregulação cerebral e das barreiras vasculares para proteger o cérebro no contexto de elevações da pressão arterial”, afirmam os autores no artigo publicado. “Este entendimento pode levar a um potencial caminho terapêutico para complicações cerebrais relacionadas à hipertensão”, afirmam os autores no artigo publicado.
Além de contribuir para a compreensão da fisiopatologia de danos cerebrais induzidos pela hipertensão arterial, o estudo abre caminhos para a pesquisa de novas estratégias terapêuticas. Também destaca a necessidade de haver uma avaliação cuidadosa da PIC em pacientes hipertensos de longa duração, apontando para uma potencial mudança de paradigma na abordagem clínica desses casos.
Com a medicina de precisão em ascensão, a capacidade de coletar dados sobre pressão intracraniana, pressão arterial periférica e central de de forma não invasiva, oferece a oportunidade de otimizar o tratamento, focando em metas específicas para cada paciente. Isso pode ser particularmente relevante para aqueles que apresentam dificuldades no controle da pressão arterial.
Dra. Polyana Vulcano de Toledo Piza
A tecnologia
Sobre a tecnologia brain4care, o médico cardiologista Dr. Weimar Sebba Barroso destaca que a monitorização não invasiva e prática proporcionada pelo método, realizada em apenas alguns minutos, pode ser facilmente incorporada à rotina dos serviços de saúde, possibilitando uma avaliação mais completa dos pacientes com hipertensão arterial. “Essa abordagem oferece uma vantagem adicional, permitindo a identificação precoce de pacientes com alterações na pressão intracraniana, o que, por sua vez, abre portas para estratégias de prevenção mais eficazes”, afirma.
Dra. Polyana reforça este raciocínio: “a detecção precoce de repercussões no sistema nervoso central pode levar a estratégias de tratamento mais específicas e eficazes, evitando o agravamento das condições de saúde dos pacientes”, diz ela. “A relevância dos dados coletados por meio da monitorização com o método brain4care permite que a equipe médica acesse informações valiosas sobre a saúde dos pacientes de forma antecipada”, completa.
Participaram do estudo os pesquisadores: Matheus Martins da Costa, Ana Luiza Lima Sousa, Mikaelle Costa Correia, Sayuri Inuzuka, Thiago Oliveira Costa, Priscila Valverde O. Vitorino, Polyana Vulcano de Toledo Piza, Gustavo Frigieri, Antonio Coca e Weimar Kunz Sebba Barroso. O artigo pode ser acessado aqui.